quarta-feira, 23 de maio de 2007

a zebra é um cavalo com código de barra. girafas são cafonas com suas estampas de oncinha


gente finíssima minha mãe. além de ter me colocado no mundo, ainda me dá comida todo dia. dia-a-dia, sem falta. mas ela anda naquela fase. aquela do triste ninho vazio que os filhotes vão embora. aquela que coincide com a chegada dos netos. estou aqui pra isso. dar muito neto pro papai e pra mamãe. é de recompensa mesmo. ela quer continuar cuidando. gosta de cuidar. mãe cuida, pai poda. mais ou menos por aí. daí quando começa o fim-de-semana-woodstock, mamãezinha quase não me vê, e quando ela acorda cedo e eu dou boa-noite, ela não gosta. então é melhor eu me cuidar porque estou ficando doente, ela diz. mas eu sempre ando com uma camisinha (que mentira) e uma vitamina cê, sou imbatível mamãezinha. mas ela não entende, nem quer entender. primeiro era o alcoolismo, pra eu evitar, tendência de famíla, coisa de gente baixa, que não tem o que fazer. agora, pelo menos, fui promovido à doente intelectual. tuberculose! você vai desenvolver uma tuberculose acordado de madrugada. tuberculose? desde quando tuberculose desenvolve-se? e se desenvolve-se aposto que uma cápsula de vitamina cê todo dia cura. desde meu breve estudo sobre literatura nacional, jurava que pra pegar tuberculose precisava, no mínimo, do superior completo. coisa de poeta, escritor. da vanguarda da angústia moderna. nunca frequentei tabernas. sempre quis. os botecos são todos abertos pra rua. bate um vento nas costas. ouvi dizer que pode até gerar uma tuberculose. tenho pastilhas mentoladas, e de agrião, algumas pra essa minha tosse seca que não passa. ela é louca coitada. ela é uma santa. minha mãe é uma santa mesmo. aposto que nunca transou. mãe cuida, gosta de cuidar. esse é o barato dela. depois que começou, que pegou o jeito, não consegue mais parar. cuidólatra. enquanto ela não é avó, ela cuida da minha. comprei uns passarinhos, mas não teve o mesmo efeito. uns fugiram, outros morreram de sede. mamãe ainda não se recuperou da vovó. então, nada de netinhos. se ela está cantando é porque ela está feliz, eu estou também! parece que nada realmente é. e apenas estamos. saio sem o agasalho e já posso acompanhá-la em meu pensamento, tá frio lá fora, põe um agasalho, mas eu não estou com frio e saio antes que ela retruque alguma coisa. brotou flores, ela cuida com muita atenção, com muito esmero, como aquela "casa muito engraçada", e eu pergunto se tem um nome e ela me diz apenas que orquídeas se chamam orquídeas, e está linda, parabéns. você sabe bem fazer isso mãe, cuidar. portanto, netinhos, te prometo uma porção deles correndo pela sala descalços com as meias encardidas desenhando pelas paredes subindo no sofá pulando na cama pelados por aí. assim como você faz para assim eu continuar fazendo. a tosse seca já passou, mamãe, {um beijo} pode guardar o xarope.

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