sábado, 15 de dezembro de 2007

ela era tão feminista que até mijava em pé

"homem bom é homem morto". não quis comentar nada. tá certo. espero que ela não esteja armada e aquela sentença não passe de desabafos-bafos de bar. olha moça, eu também acho que a sociedade, como um todo (issui inclui todos os heteros e homos), é machista, e isso gera uma série de empecilhos na emancipação e realização pessoal, quem sabe plena, das pessoas, inclusive dos homens. o machismo é uma herança patriarcal, que, segundo alguns antropólogos tem ligação direta com a propriedade privada, com a acumulação de capital, que moldou a estrutura conjugal monogâmica burguesa que conhecemos até hoje, para garantir aos filhos legítimos do macho as riquezas do pai e do avô. claro que tem uma série de outros fatores importantes inclusos, desde a força física maior que os homens tem, a violência direta contra as mulheres e uma história de opressão contra sexo feminino, numa relação de abusos, estupidez, concluindo numa sociedade estruturada de modo injusto e, portanto, infeliz. mas pense bem, se todos os homens morrerem, o trânsito se tornará finalmente o caos completo, todas as lâmpadas queimadas perdurarão para a eternidade, e, quando eu ia falar sobre os potes de conservas que mofariam sem nunca se abrir, levei uma na cara pra nunca mais fazer piadas em lugares errados. feministas sabem bater. elas são bravas. fico imaginando como elas devem ser na cama...

babuínos sabem do que eu estou falando

escrever faz um bem danado quando ninguém lê. como aquelas frases de porta de banheiro público. uma vez quase saí na mão com um cara de um bairro aí. eu escrevi "meu bairro é foda, foda-se os outros bairros". daí ele escreveu, "bairro de viado o teu", daí escrevi com letras garrafais logo embaixo "fica esperto". uma semana depois estava escrito mais embaixo "sua bicha, vou te matar". daí fiquei putasso e escrevi, "sabe com quem você tá falando?". quando eu pensei que eu tinha dado uma lição nele, ele me volta com "lá na minha área você não dura cinco minutos mané Flávia te amo". achei estranho aquela coisa de amor, cara confuso. fechei o zíper e nem dei descarga, problema do próximo. vai que é ele.
escrever faz um bem danado quando ninguém lê. ou então quem quer que seja que tenha lido, essa pessoa deve estar distante num raio de 300 a 400 quilômetros. porque o que se escreve é exatamente aquilo que não falamos. um complementa o outro. falar é tornar exposto o que se pode tornar exposto. escrever é um modo sofisticado de lubridiar o trio-ternura da casa de máquinas de nossa alma: sr. ego, bonito, pomposo, caminhando a passos precisos e sorrindo e acenando; o sr. superego, cisudo, tenso, controlador, caminha com sua bengala pesada e que machuca; e, lá atrás, senhoras e senhores, o senhor id, anarquicamente pelado, fazendo o caminho inverso e derrubando coisas ao seu redor. se vocês repararem bem, ele acabou de colocar um piercing artesanal naquele lugar, e vejam como ele chacoalha com estusiasmo.
adoro escrever sobre nudez e coisas que chacoalham. babuínos, definitivamente, sabem do que eu estou falando.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

entre postes e córregos

gosto de andar bem rente às vitrines pra pensar que elas estão olhando pra mim. gosto de acariciar cachorros e fazer o bem em público. sozinho eu ainda gosto de cachorros e de fazer o bem, mas em público eu gosto mais ainda. gosto de fingir que não gosto de fazer o bem em público. gosto de fingir em geral.
ele tinha se esforçado pra chegar lá, mas estava cinco minutos atrasados, e bem, vocês conhecem a trupe, o circo não podia parar, e nem esperar por seus palhaços. ele não tinha um puto no bolso. nem o dinheiro da cana, nem o dinheiro da volta. sentou em vão, esperando o contato de um serviço eletrônico que não aconteceria.
gosto de falar de mim e de falar das coisas que eu gosto. gosto de mim porque às vezes acho que ninguém mais gosta.
ele ganhou uma cerveja gelada e um copo limpo. estava sentado a esperar o nada acontecer, como se no nada sempre pudesse conter, bem de leve, algum tudo de expectativa. a cerveja foi por conta da casa, dos papos e da camaradagem. procurava sem muito esforço por garotas interessantes.
quando conheço uma pessoa que não gosta de mim, me esforço pra não gostar dela, mesmo gostando de pessoas que não gostam de mim. minha amiga diz que eu tenho um complexo. meu amigo diz que eu tenho problema. gosto quando as pessoas reparam em mim, mesmo pra fazer críticas.
sua única cerveja acabava e nem estava no meio da madrugada. aparece um colega, e assim poderia definir bem aquele sujeito que ele nem gostava muito, mas também não detestava. era um colega. seria bom se ele pagasse uma cerveja pra ele, seria um modo justo de aguentá-lo. ele avisou da sua precária condição, da fuga da trupe, e, com o seu colega mais aquecido no negócio, foi fácil conseguir mais uma garrafa. esse era o princípio.
gosto daquele tipo de morena, gosto também daquele jeitinho que aquelas orientais têm. claro que gosto da cor do Brasil, e até gosto de estrangeiras quando estão de boca fechada ou não estão tentando demonstrar que se adaptaram ao Brasil. gosto daquelas exóticas, mas não muito pra não dar vergonha. exótica sem chilique.
eles conversaram qualquer assunto que pudesse gerar um outro assunto que pudesse gerar uma outra cerveja que pudesse gerar um outro assunto e assim por diante: basicamente conversaram sobre mulher e futebol.
uma vez quase entrei numa aposta, simbolicamente claro, eu gosto de de dinheiro e apostas, portanto sou fraco, e eu gosto de ter auto-controle, por isso foi uma aposta simbólica mesmo. ah tá, a aposta era sobre um determinado número de garotas num determinado tempo. era difícil mas não era impossível. eu até estava na média, mesmo não gostando de pertencer à média, quando empaquei numa guria de um cabelo perfumado.
a noite foi basicamente aquilo. sozinho e ao mesmo tempo acompanhado, sobraram os dois, e mais meia dúzia de quaisqueres num dia que amanhecia. havia uma garota, na verdade uma mulher. estranha, mas pictoricamente atraente. estamos falando de um palhaço-trapezista, que gosta de desafios, sem nunca perder a piada. o colega era o que mais conversava. tinham até assuntos em comum. ele só olhava. ela olhava também. o colega falava. o gordo por perto foi o primeiro a desistir. o colega falou tanto que acabou não dizendo nada. ele parou de olhar e, numa brincadeira mais simplória, respirou fundo e meteu bronca pra cima daquela. entre postes e banca de jornal, o sol nascia.
gosto de trocar de personalidade. gosto de usar roupas alheias. gosto de pensar que aquilo vai ficar para posteridade, mesmo agindo como se jamais houvesse posteridade, e tudo aquilo simplesmente existe apenas no agora. e agora vale-tudo. eu gosto de pensar só no instante, enquanto estou nele.
ele já estava sozinho com mais dois camaradas de bar, uma estranha, e ainda nenhum dinheiro no bolso. ele morria de sono no segundo boteco. ele bebia, dançava, dormia, comia, conversava, e ria sem saber porque. ele queria ir embora e ela também. ela morava bem longe mas disse que era perto. o palhaço-trapezista ficou em dúvida se aquilo seria uma torta na cara ou um picadeiro aplaudindo em pé. ele atravessou a cidade e fez malabarismos num lugar ermo onde a fechadura foi substituída por um buraco na porta com uma corrente velha. o teto era de zinco e havia uma bíblia na cômoda. na cama, uma mórmom. com certeza o show durou muito menos que a jornada. na volta, uma realidade a pé. uma paisagem cinza, um córrego e prédios abandonados. pessoas simples e gentis. um ônibus e agora ele cochilava e já estava na avenida mais cara e branca e protegida e movimentada e chique e blasé e tudo da cidade. foi só o tempo de acordar e dar o sinal pra descer. o motorista abriu a porta. ele desceu. a platéia foi a loucura. o picadeiro era dele.
gosto de inventar histórias e usar camisetas incentivando o vegetarianismo. mas eu gosto mesmo é de carne.