sexta-feira, 18 de maio de 2007

ele foi um bom comunista até conseguir um bom emprego.


havia dois senhores. se ouvia dois senhores. uma súplica e uma, espécie assim, de súplica também. segurando uma bíblia, ele tocava no ombro da senhora e dizia, pedia, sacramentava, se assentia e assentava, pelo Senhor. segurando uma prancheta, ela indicava valores, prazos e benefícios, pelo Banco. através da fé, Jesus te empresta um bem-estar espiritual, através de um cadastro, o Banco te empresta dinheiro. nos dois você paga, mais cedo ou mais tarde. na mesma praça, um ao lado do outro. no centro da cidade precisa-se vender para viver. alguma coisa. teve uma garota que não me chamou de senhor, mas já foi me cumprimentando, pegando minha mão, me oferecendo qualquer coisa e literalmente me segurando para ouvi-la. estilo as ciganas do viaduto do chá (só que sem aqueles dentes de ouro e o sotaque medonho). apliquei um golpe de judô e me safei da moça. no centro da cidade precisa-se comprar para se livrar (ou se desviar com destreza). o centro é assim, a cara da cidade: multiétnico, superlotado, sujo e feio. é a anti-coluna social. seja quem for aquelas pessoas bem vestidas das festas-celebridades, com seus branquelos sorrisos standarts de capa de revista, com certeza eles não passam pelo nosso centro-bueiro-michê-churrasco-grego-mendigo-cola-de-sapateiro-barulho-
poluição-prédios-antigos-bonitos-cinemas-pornôs-e-profetas-da-cidade.
mas tem coisa boa também. se eu continuasse a dormir na rua com certeza moraria no centro. lá tem chafariz, sombra, música ao vivo, muito lixo pra eu mexericar e, qualquer coisa, tem o metrô que sai para quase toda cidade.